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Depois de cair no início do ano, com o fim do IPI para automóveis e produtos da linha branca, o ritmo de importação de bens de consumo duráveis, como automóveis, celulares, eletroeletrônicos e móveis, acelerou nos últimos meses. Foi empurrado pelo aumento e pela mudança no consumo das famílias, o dólar barato e o interesse mundial no mercado brasileiro. A importação de geladeiras e refrigeradores aumentou quase 240% de janeiro a maio. Enquanto a inflação doméstica sobe, o preço dos bens de consumo duráveis importados pelo país caiu 6,4% no acumulado do ano até maio.
As compras de máquinas e aparelhos de uso doméstico crescem mês a mês. Foi de 160% em abril comparado a abril de 2008, e chegou a 180% em maio. "As empresas que descobriram o caminho da China não abrem mão das importações", confirma o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Sussumu Honda. "Ferro elétrico, que se encontrava nas lojas na base de 20% importados para cada 80% nacionais, inverteu a proporção e agora 80% são comprados da China." A progressiva troca de lâmpadas incandescentes por lâmpadas frias também pesou nas importações, garante. "Vem tudo da China."
As estatísticas do Ministério do Desenvolvimento confirmam a impressão dos lojistas. A importação de lâmpadas foi a que mais cresceu entre os 20 principais bens de consumo duráveis na lista de compras do país - um aumento de 165,7%, que elevou o gasto com esses produtos a quase US$ 200 milhões de janeiro a maio deste ano. Curiosamente, foi importada uma quantidade 20% menor de ferros de passar, mas a um preço 35% maior, em média, o que elevou em quase 8% as importações do aparelho, indicação de que o consumidor brasileiro tem buscado modelos mais sofisticados.
As importações de bens de consumo duráveis, que em maio de 2009 representavam pouco mais de 8% das importações brasileiras, já absorviam US$ 1 de cada US$ 10 gastos nas importações totais do país em maio. Somadas as compras dos cinco primeiros meses do mês, os bens duráveis são 9,5% do total (eram 8,1% no mesmo período do ano passado). Quase metade desse desempenho se deve à importação de automóveis, que ultrapassou US$ 2,8 bilhões nos primeiros cinco meses do ano, 77% acima de igual periodo de 2009.
É notável, porém, o crescimento de outros itens de consumo doméstico e pessoal: as importações de celulares cresceram quase 150%, as de máquinas de costura, quase 125%, de aparelhos de rádio, 107%, de móveis, 35%, e de artefatos plásticos, 33%. Os fabricantes nacionais, porém, têm evitado reclamar da onda de importados.
A Eletros, que reúne empresas do setor e era uma crítica habitual da competição estrangeira, recusou-se a atender os pedidos de entrevista sobre o assunto. Segundo especialistas do setor, o silêncio se explica porque as empresas instaladas no país agora vendem mais produtos trazidos do exterior.
"Boa parte dessas importações é feita pelas próprias indústrias no país", confirma o superintendente da Associação Comercial de São Paulo, Marcel Solimeo. "O aumento da demanda foi mais forte que o da produção", comenta. Segundo o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, a diferença entre o crescimento da demanda no Brasil, de 10%, e o crescimento do mundo, de 4%, faz com que as companhias mundiais passem a direcionar ao mercado brasileiro a produção antes destinada aos Estados Unidos e à Europa, economias em retração.
Um dos efeitos da migração para o mercado brasileiro é a queda de preço médio nos produtos importados, o que aumenta o apelo ao consumo. Entre janeiro e maio, enquanto o volume dos bens de consumo duráveis cresceu 78,2%, o preço médio dessas mercadorias caiu 6,4%, comparado ao mesmo período de 2009. Foi o maior percentual de aumento do volume importado entre todas as categorias de uso e o maior percentual de queda no preço. A importação de intermediários cresceu 50% em volume e teve queda de 5,1% nos preços.
A Copa do Mundo também teve seu efeito: aumentou em 1.800% a quantidade de televisores de maior porte importados entre janeiro e maio, em comparação ao mesmo período do ano passado, mas o preço médio caiu 11%. Não é um caso isolado. A quantidade de máquinas de lavar louça importadas aumentou quase 570%, beneficiada por uma queda de quase 20% nos preços médios. "O Brasil está na moda, virou um país de classe média", constata Borges.
A queda na cotação do dólar torna os importados mais baratos em reais, lembra ele. Borges comenta que a relação entre o real e uma cesta de moedas de 23 países se aproxima da média entre 1995 e 1998, auge da política de câmbio fixo do Plano Real. Ele exibe gráficos para mostrar que a evolução da cotação entre real e dólar tem acompanhado a dos gastos com importação de bens duráveis. "Mas esse crescimento tão alto no consumo, inclusive, não vai se sustentar", prevê o economista, baseado nas medidas do Banco Central para conter a demanda.
Não há, porém, sinais de arrefecimento no consumo, e um dos fatores para isso é o aumento da parcela dos orçamentos domésticos destacada para compra de bens de consumo duráveis. O fenômeno foi notado em famílias de todas as classes de renda, como mostrou na semana passada a Pesquisa de Orçamento familiar (POF), do IBGE.
As famílias com renda mensal de até R$ 830 em 2008 (dois salários mínimos na ocasião) gastaram, em média, 3,2% do orçamento com eletrodomésticos, 2,4% na compra de veículos, e 0,4% na compra de celulares. Na POF anterior, as famílias na mesma faixa de renda destinaram 2,6% aos eletrodomésticos, 1,66% para veículos, e 0,09% para celulares. O maior aumento no comprometimento da renda familiar com estes três produtos ocorreu nas faixas de renda abaixo de R$ 2,5 mil.
A disposição para gastar mais em bens duráveis está ligada à maior disponibilidade de crédito e à existência de produtos mais baratos. "Nos últimos três anos, de 2007 a 2009, entraram no sistema de consultas do serviço de Proteção ao Crédito (SPC) cerca de 30 milhões de pessoas", conta Marcel Solimeo. O país ainda sente o efeito do salto na renda da população, comenta. "Quando arrefecer esse impacto, devem voltar os apelos para travas à importação", prevê.